NOTAS À IMPRENSA – ARREMEDOS.

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GOVERNO DILMA E OS FANTASMAS

 

Carlos Melo(*)

 

A entrevista concedida pela presidente Dilma Rousseff, ao jornal Valor (17/03) teve como principal intenção combater e reverter expectativas negativas em relação à inflação. Não foi sem pensar que escolheu o jornal cujo público é formado por agentes de mercado. Seu balanço traz elementos positivos que não precisam ser ignorados, mas também revela fragilidades que não podem ser ocultadas.

De positivo, o fato de a presidente estar “ligada”, mostrar-se sensível às questões e aos fantasmas que rondam a economia. Não foi “imperial” nem “majestosa”; não está num pedestal aparatada da realidade. Foi ao público no momento em que ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central estão na berlinda.  A presidente sabe que dialogar é preciso e isso é bom. Afinal, nem tudo é glória após uma vitória eleitoral.

Detectada a existência de um clima inóspito, buscou amainá-lo. Lançou mão de questões lógicas, escudou-se sobre o prestígio das análises do ex-ministro Delfin Netto. Procurou propor outro olhar para a questão fiscal, monetária e cambial. Com efeito, há uma disputa de opinião a travar e a presidente não se furtou do papel que a liderança lhe exige, a persuasão.

Mas o dom de persuadir requer argumentos de difícil refutação; requer habilidade para seduzir. Eis aí o aspecto frágil da entrevista: Dilma tem dificuldades em convencer a que escolheu se dirigir; não encanta profundamente por se limitar ao que seus interlocutores enxergam como superfície de questões que apenas tangencia, sem ir ao ponto.

Reafirma compromisso com o que, imagina-se, esteja dado, a estabilidade. E o faz por meio de frases que servem aos programas políticos de TV, mas não à política de verdade, que confronta interesses: “não há um pouco de inflação assim como não há um pouco de gravidez”. Sim, e daí? “Como as unhas, as despesas públicas precisam ser frequentemente aparadas”, Ok. Em que dimensão?  Garante que continuará a “guerra contra a inflação”. Não poderia dizer outra coisa.

A presidente ousa acreditar que pode garantir a tranquilidade e reverter expectativas se valendo apenas de “retórica”. Nem Lula conseguiria. O mercado é mais indócil do que as telespectadoras de Ana Maria Braga. Não se dá a promessas, a romantismos e nem aos bons sentimentos. Isso não é com ele; é composto indivíduos de pouca fé e é natural que assim seja: não rasgam dinheiro. Nem por amor.

Se da presidente não se pode exigir que entregue estratégias e revele políticas que pendentes de negociação; se não é saudável que antecipe medidas capazes de provocar movimentações de mercado, também não cabe permitir que seu pronunciamento, por inócuo, seja ignorado. O fato é que, ao ocultar mais que revelar, e revelar o que já está exposto, banaliza a entrevista, tornando-a um anticlímax.

E assim, ficou pelo caminho, um copo meio cheio, meio vazio: se às políticas do BC não põe reparos, também não ajusta e nem esclarece o que já é visto como frouxidão; renúncia ao regime de metas de inflação. Se as reformas não nega, admite tão somente retoques onde se sabe que cosméticos não bastarão.

Pretendeu expressar o que seus interlocutores gostariam de ouvir, mas seus interlocutores esperavam mais. Como mandatária máxima, lhe cabe ir além dos auxiliares.  Mantega e Tombini já expressaram as mesmas platitudes; desnecessário, portanto, repeti-las. Se não for para avançar, para que se expor?

A melodia da liderança não se toca por acordes dissonantes, sem o necessário diapasão da clareza, sem o convincente tom da determinação. O mercado esperava “um custe o que custar” mesmo que esse custo seja a contenção temporária do crescimento; mesmo que implique decepar cabeças.

A presidente não está convencida disto; parece crer numa fórmula que não está sendo transmitida competentemente, de modo claro e didático, cabalmente. Ademais, para proteger auxiliares, se deixa enveredar por estocadas desnecessárias como acreditar que estariam tentando diminuir a importância do BC “porque não tem ninguém do mercado na sua diretoria”.

O que é para ser apenas uma queda-de-braço pode se transformar em luta de boxe. A presidente jabeia diante de adversários que sabem soltar ganchos e cruzados. Precisará ficar grogue para ficar desperta?

Desde a eleição, apostávamos que Dilma não faria loucuras e que seu governo não seria voluntarista, vocacionado a bobagens. O PT teria pouco espaço, como de fato tem, e os espíritos mais heterodoxos seriam convertidos. Tal foi assim que até Guido Mantega se banhou nas águas do Jordão do pragmatismo.

Contudo, esse pragmatismo se tende a se expressar apenas diante das circunstâncias e não antes que elas se apresentem. É temerário; pode ser tarde. Uma frase repetida nos prognósticos do ano passado deve ser resgatada: “é possível que a situação, primeiro, piore para, depois, melhorar”. Não precisaria ser assim, embora pareça inevitável.

O fato é que o discurso da presidente serviu apenas como um arremedo de contenção dos ânimos, assim como tudo no seu governo até aqui parecer ser um arremedo: arremedo de reformas — tributária, previdenciária e política –, arremedo de política monetária, arremedo de política fiscal; arremedo de articulação. Cedo para sentenciar que se trata de um “arremedo de governo”. Mas, o carnaval passou, os simbólicos 100 dias se esvaem; é necessário agir.

Ainda cabe crer que, em algum momento, o governo reagirá mais enfática, viril e determinadamente, “custe o que e quem custar”, que supere o Road Show de intenções e retóricas. Tudo bem que queira impor ao mercado o seu próprio ritmo; é legítimo. Mas, às vezes, o ritmo se altera e irrompe o caos; tão impávido, forte e infalível como um tsunami, suas ondas arrasam tudo. A boa construção requer estruturas mais profundas.

 

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Nota do Editor: (*) Carlos Melo é cientista político e professor do Insper e também autor de “Collor, o ator e suas circunstâncias”. O artigo é uma análise da entrevista da presidente Dilma, publicada no Valor Econômico, no último dia 17/03.

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